segunda-feira, 29 de agosto de 2011

O hard news agora é assessoria


James Capelli (foto: Nilton Carvalho)



Perfil do assessor de imprensa, jornalista, escritor, apresentador e professor, James Capelli. Redigido para a disciplina de Assessoria de Imprensa (4º ano do curso de jornalismo - Universidade Municipal de São Caetano do Sul - USCS)





Por Nilton Carvalho





Os cabelos brancos denunciam a experiência que o jornalista, escritor, apresentador e professor - não perca a conta - James Capelli, possui na área da comunicação. Na memória, a lembrança do jovem repórter que foi atraído pelo lado romântico da profissão, segundo ele, a pessoa que investiga a verdade e divulga para as pessoas os assuntos. Algo que dialoga com o lendário texto Jornalismo, o melhor ofício do mundo, de Gabriel Garcia Márquez.



Durante a conversa que tivemos, no escritório onde trabalha, James falou sobre a carreira, que é recheada de passagens por diversas redações.
- Comecei a atuar em jornalismo há 25 anos – Relembra o profissional, que já passou por meios de comunicação como a extinta TV Manchete, Cultura, Gazeta e Globo, sem contar veículos impressos como o Diário do Grande ABC.



Hoje, James não trabalha mais produzindo conteúdo jornalístico diário, também conhecido como hard news. O jornalista abriu a empresa Escritório de Mídia, com o sócio e amigo de longa data, Danilo Angrimani, que presta Assessoria de Comunicação e desenvolve trabalhos de imprensa, mídia, marketing e propaganda, além de ser também editora.
O primeiro emprego na área da comunicação foi como assessor de imprensa concursado na Secretaria de Educação do Estado, um tipo de serviço que a atual empresa também presta. Ao relembrar o início de carreira, na época em que esteve em grandes redações, como a Rede Globo, o jornalista destaca a rotina puxada.



- Um dos locais onde eu trabalhei com a escala mais estranha foi na Rede Globo, não havia pré-escala definida... – Conta. Ao citar tal etapa da carreira, James alega que até mesmo para agendar uma simples consulta no dentista encontrava dificuldades por conta dos horários conflitantes impostos em um dos principais meios de comunicação do país.
Os anos de atuação na área proporcionaram ao jornalista a possibilidade de optar por uma rotina de trabalho mais flexível.
- Sempre quis estar próximo dos meus filhos, da criação deles. Isso veio depois de certa estabilidade profissional, a oportunidade de abrir uma empresa de assessoria de comunicação – Comenta a fase atual.



Ao fundo da sala principal do escritório de James Capelli nossos olhares escapavam, vez ou outra, para a televisão que exibia a partida válida pela semifinal da Liga dos Campeões da Europa, entre Barcelona e Real Madri. Como já havia trabalho com James, durante alguns meses, sabia que o jornalista é torcedor do Santos e não foi preciso entrar no assunto futebol.
Quando voltamos a conversar sobre a rotina de um repórter de jornal diário, James contou que a paixão pela notícia sempre moveu sua trajetória em jornalismo.
- Acho que o cara, principalmente o jovem, quer mais é estar na frente de trabalho – Diz, ao justificar a sede pela informação, presente no dia-a-dia do repórter.



Ao ser questionado sobre assessoria de imprensa, James chegou a me surpreender com a resposta, mas obviamente, o desfecho justificou o impacto da primeira impressão de suas palavras.
- Eu não acredito em assessoria de imprensa... A assessoria real, hoje, é a de comunicação – Concluiu de maneira precisa, ao apontar que o desenvolvimento de um release, contato telefônico no follow-up e o acompanhamento de uma entrevista representam apenas um pequeno segmento da área de assessoria de comunicação.
Dentre os tropeços das assessorias de imprensa, James não esquece que o que mais desgasta a relação assessor/jornalista é a ligação fora de hora. Neste caso, o profissional que já atuou nas duas áreas, tem maior possibilidade de evitar desavenças.
- O cara que não sabe o que é um “pescoção”, que nunca viveu, não sabe o que é o fechamento do jornal para o final de semana... Ele não vai saber de fato a hora de entrar em contato – Ressalta o jornalista, que tantas vezes passou pela correria de um fervoroso fechamento. Para James, é importante transitar pelos dois lados.



Outro aspecto marcante da profissão assessor de imprensa, sem dúvida, é a relação com o cliente. Não foram poucos os profissionais que perderam determinadas contas por serem pressionados por causa de reportagens não publicadas ou porque prometeram veiculações impossíveis.
- É preciso saber o que é notícia – Alerta, ao lembrar que o cliente precisa ter uma visão coerente das possibilidades e é função do assessor estabelecer uma relação de trabalho, baseado em um planejamento, para que se possa chegar aos objetivos.
- O cara quer aparecer no Jornal Nacional e possui uma empresa de pneus, daí eu pergunto: “o que está acontecendo com a sua empresa?” – Conta.
De acordo com James, o empresário, responsável pelo setor de marketing ou de recursos humanos contrata a assessoria de comunicação, geralmente, para resolver problemas. Quem está sendo contratado precisa identificar esses problemas e deixar bem claro os caminhos para que a necessidade do cliente seja atingida.



O ano de 2011 tem sido importante para James Capelli. Afinal de contas, vai ser difícil esquecer o primeiro livro publicado. O lançamento do romance policial com pitadas de experiências factuais, Elo, trouxe à tona a experiência de roteirista dos tempos de TV Cultura e as reportagens sobre boletins de ocorrência.
- Faltava colocar em prática o lado ficcional – Diz o autor, sem deixar de lado o ponto forte que marcou a construção do romance.
- Claro que o livro é embasado em experiências que tive na vida. É um livro policial e alguns dos crimes, ali relatados, eu vi de perto como profissional – Ressalta.



O conhecimento, alimentado ao longo de todo esse tempo na área da comunicação, conduz James ao perfil de professor. Como se não bastasse, o jornalista também é contratado para implantar departamentos de jornalismo e dar treinamentos. Foi assim que conheci o trabalho dele pela primeira vez, quando comecei a estagiar em uma Web TV da região do Grande ABC. À época, James assumiu o desafio de liderar uma equipe de jovens jornalistas, fui contratado após passar por um teste, seguido de entrevista, e aprendi algumas lições importantes, durante os meses em que trabalhamos juntos.



Aliás, quando a entrevista que gerou este texto chegou ao fim, James ainda deixou mais uma boa lição, para quem está começando a construir uma carreira.
- Depois de uma certa experiência, você vai buscar, como eu disse, após ter passado muita coisa, os seus confortos e os seus desafios – Pondera. Uma boa dica para quem pretende se formar jornalista.

terça-feira, 19 de julho de 2011

A arte que alimenta a vida

Mariana Meloni (foto: acervo pessoal)



Perfil da professora de Fotojornalismo, Mariana Meloni, da Universidade Municipal de São Caetano do Sul - USCS.






Por Nilton Carvalho


Era um sábado de muito calor. A entrevista, agendada para o final da tarde, me deu a tranquilidade suficiente para que eu pudesse dar uma passada na Pinacoteca do Estado de São Paulo para conferir a exposição do artista russo, Aleksandr Rodtchenko (1891-1956). O trabalho de Rodtchenko na área da fotografia, aliás, é apreciado pela professora Mariana Meloni, 34, que eu iria entrevistar naquele mesmo dia.


Quando cheguei ao apartamento de Mariana, que ela divide com a amiga Dani e com duas gatas de estimação, localizado no bairro Higienópolis, em São Paulo, pude observar que o aspecto do local dialoga com a paixão que professora tem pelas artes. Alguns trabalhos dela enfeitam a sala de estar, dentre eles, uma série feita com uma polaróide. “Na verdade, é auto-retrato. Mas estou trabalhando com performance, trabalhando com personagens, não sou eu exatamente, é um personagem que eu representei. São três mulheres diferentes, são três personas”, conta. Ao lado esquerdo da sala, um armário guarda um acervo de fitas VHS, da antiga produtora de vídeos independentes, que a professora tinha, chamada Brócolis VHS. A bem sucedida produtora era gerenciada em parceria com o antigo namorado, mas, como nem tudo dura para sempre... “Depois eu terminei o namoro, não quis mais saber de fazer vídeos”, diz Mariana sem deixar escapar os risos, após fazer a brincadeira.


Na vida, muitas lembranças fazem com que o nosso presente seja compreendido de uma maneira mais clara e Mariana me contou que uma das pessoas que mais influenciaram sua carreira de fotógrafa foi o avô. “Ele dizia: pra arte você leva jeito. Ele era o único que falava”, lembra. No entanto, a entrada para o universo da fotografia veio somente durante o curso de Ciências Sociais, quando Mariana começou a estudar fotografia paralelamente. Além disso, o contato com a disciplina de “Antropologia Visual”, também ajudou. “Eu continuei fazendo, mas sempre tentando incorporar a imagem e o vídeo, que era outra coisa que me interessava muito, ao curso de Ciências Sociais”, diz.


Apesar de ter pesquisado sobre Mariana, antes de realizar a entrevista, fiquei surpreso quando soube que ela nasceu em Juiz de Fora, Minas Gerais, se a professora não tivesse me avisado, seria praticamente impossível perceber que ela não nasceu em São Paulo. No entanto, Mariana está acostumada com mudanças em sua vida. Certa vez, a mãe da professora ganhou uma bolsa de estudos para ir à Inglaterra, fato que fez Mariana estudar na terra da rainha dos quatorze aos dezoito anos. “Já pensou? Eu tinha quatorze anos, queria ficar aqui com os meus amigos e tive que ir embora” lembra. Mas, apesar das dificuldades de ter indo para um país diferente com pouca idade, Mariana também vê o lado positivo. “Foi uma experiência super rica”, diz.


Quando o assunto é fotografia, disciplina que ela ensina na Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), Mariana não esconde a paixão pela área. “Ela está em tudo. A fotografia está presente no cotidiano mesmo, como você faz a sua vida. Como uma grande obra de arte”, conta em tom filosófico e sorri após a frase impactante. Para a professora, uma boa foto é aquela que toca a pessoa de alguma maneira, mas para ela, o fotógrafo também precisa romper alguns padrões. “Ela pode ser boa em diversos sentidos”, explica. Mariana se interessa por fotos que tragam algum tipo de crítica social e também denúncia. Para ela, quando existe um padrão e você rompe ao abordar a imagem de outra maneira, também pode tornar uma foto boa. “Acho que um exemplo disso é aquela foto do urubu e da menininha, ela está trazendo um questionamento social”, conta.


De acordo com Mariana, a fotografia, assim como as artes, de uma maneira geral, precisa abordar o lado social. Seja através da sátira ou até mesmo o fato de uma banda fazer música ruim, propositalmente, é algo que pode questionar. “Eu gostaria de ter mais relação com a política”, confessa a professora. Mariana também destaca que até mesmo quando levamos arte às periferias estamos fazendo um trabalho social.


Outro assunto que não poderia faltar em nossa conversa é o lado professora, de Mariana. A ideia começou logo após o curso de Ciências Sociais. “Eu terminei a faculdade e fui fazer mestrado em fotografia. E quando você termina o mestrado uma das opções de trabalho é dar aula. É uma maneira de estar em contato com o conhecimento e de sobreviver também”, lembra. Apesar das dificuldades no início da carreira, como por exemplo, dar aulas em salas com muitos alunos, Mariana conta que vive a profissão de professora intensamente hoje em dia. “Eu sou professora vinte e quatro horas. Não sei, você está conectado, não é? Você não se desconecta”, diz. Mesmo durante as folgas, quando a professora sai por aí sem nenhuma responsabilidade ou horário pré-estabelecido, ela não deixa de pensar em como enriquecer o conteúdo das aulas. “De repente estou numa livraria, daí eu vejo um livro, “ah, vou levar esse livro na aula”, sabe? É uma coisa muito parte da vida mesmo”, explica. Vida que também traz diversos projetos, todos relacionados à arte.


Um desses projetos, e um segredo que consegui descobrir em primeira mão, é a elaboração de um livro de receitas. Sim, Mariana ama cozinhar. A tradição vem de família, a mãe cozinhava, a avó cozinhava e com ela não foi diferente. “O meu novo projeto é um livro de receitas. Gosto de fazer comida e inventar pratos”, diz a professora. O doce petit gateau é uma das especialidades de Mariana, mas, outros pratos como macarrão ao molho de gorgonzola, com tomates frescos e manjericão também faz sucesso entre os amigos e a família. Quando pergunto de onde vem o prazer de cozinhar, Mariana é direta: “porque eu sempre gostei de comer, então é assim. Eu tinha que aprender a fazer as coisas que eu gostava de comer”. A professora já até projetou o lançamento do livro e optou por uma idéia bastante alternativa. “Eu quero fazer o lançamento aqui na minha casa, com os meus amigos e com comida. Vai ser ótimo”, conta cheia de entusiasmo.


Em determinado momento da conversa, a amiga Dani chega e eu explico a ela que vou escrever o perfil de Mariana, então ela diz: “ah, escreve sim, ela é ótima”. Após receber o elogio da amiga, a professora continuou me contando sobre seus projetos e sua vida. Como eu já havia escutado o toque do celular dela, e reconhecido a canção, perguntei sobre o seu gosto musical. E para a minha surpresa, Mariana também gosta muito de uma das minhas bandas favoritas. “Você sabe que eu gosto de The Clash, que eu amo, que é a música do meu celular (risos)... É a Spanish Bombs, que é maravilhosa”, concluiu.


É difícil não relacionar a vida da professora Mariana com as artes porque as atividades rotineiras em sua vida enfatizam essa proximidade. Além do trabalho com a fotografia, Mariana ainda tem tempo para se dedicar às aulas de desenho, balé além de um projeto que agrega dança e vídeo, com o namorado Ira Tan. Outro trabalho que a professora tem desenvolvido é com um estilo de fotografia alternativo, feito com câmeras pinhole, que são máquinas artesanais, elaboradas a partir de um tipo de papel especial. “Para fazer uma foto você não precisa nem de dinheiro, você mesmo pode fazer a sua. Essa política que é legal, o “do it yourself” (faça você mesmo), que é a frase punk, lembra? Esse é o punk da fotografia”, explica. Mesmo com todas essas coisas ocupando o seu tempo, ao logo da semana, Mariana se diz uma pessoa normal, como qualquer outra. Isso porque além dos compromissos profissionais e projetos ela ainda encontra tempo para cuidar das gatinhas de estimação, Ximbica e Petite, e também dos afazeres de casa. Mas, para alguém que já possui a experiência necessária e sabe se virar sozinha e correr atrás dos objetivos, isso não é nada que a professora Mariana não dê conta.


Em meio à toda essa agitação a professora, fotógrafa, artista e culinarista segue desempenhando muito bem todas essas funções, sempre com muita dedicação. Para resumir a relação de Mariana com seus projetos talvez o melhor termo que eu deva utilizar para finalizar este texto seja o “faça você mesmo” e é bom lembrar, que o próximo será o tão aguardado livro de receitas, cujo lançamento eu tenho orgulho de ter sido convidado e, certamente, não irei perder.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Após ganhar experiência, escolha o que é melhor pra você

A jornalista Heloísa Noronha



Texto elaborado após a palestra, realizada pela jornalista Heloísa Noronha, na sala da turma do 4º ano de jornalismo da Universidade Municipal de São Caetano do Sul - USCS.




Por Nilton Carvalho

A vida possui diversas etapas. Entrar no mercado de trabalho é uma delas, até porque, ter uma profissão é essencial para sobreviver. Esta fase da vida começa com a escolha do curso de graduação, segue com a fase pós-diploma, quando chegam as primeiras experiências profissionais, e se estabiliza com a conquista de espaço na área. Claro que não se pode esquecer que grande parte das mulheres ainda precisam se preocupar com os filhos e com a família.


Seja qual for a profissão, geralmente, essa é a trajetória de uma mulher no mercado de trabalho. Mas, o que fazer quando já possuímos a experiência necessária e queremos optar pelo que é melhor para nós? O ideal é definir um projeto de vida e seguir em frente, mesmo que seja necessário mudar de emprego.


A jornalista de longa data, Heloísa Noronha, que passou por diversas redações, incluindo jornais impressos e revistas como Nova, Contigo e Corpo a Corpo, sem contar os livros publicados, é um bom exemplo de profissional que escolheu o conforto, após anos de muito empenho. Até pouco tempo atrás, Heloísa precisava enfrentar o trânsito pesado de São Paulo, todos os dias, ao sair de São Caetano do Sul, que fica na região do Grande ABC, para chegar até a redação da revista na qual ela trabalhava, localizada no bairro Casa Verde, zona norte de São Paulo.


Como a jornalista também colabora na editoria de comportamento do Portal UOL, decidiu que seu trabalho, na área de revistas, seria somente como freelancer, ou freela, como o jornalista que colabora com reportagens, mas que não possui vínculo com a revista é chamado na linguagem das redações. A opção de ser freela permite que Heloísa continue escrevendo suas matérias para a revista, sem precisar estar na redação todos os dias. O trânsito caótico de São Paulo, agora nem pensar. Além disso, a jornalista pode dedicar mais tempo aos projetos paralelos, como seu próximo livro, que desta vez será ficcional, sem contar que ela também pode ficar mais com a família.


A rotina profissional de Heloísa é um bom exemplo para mulheres que já possuem certa experiência, em determinada área, e que agora querem optar pelo bem estar. Para quem trabalhou tanto tempo e, muitas vezes, passou por momentos difíceis, chega a fase de fazer escolhas. Seja para tirar projetos pessoais do papel, realizar sonhos ou curtir mais a família, essa é a hora. Se a vida é cheia de etapas, é preciso saber aproveitar e enfrentar cada uma delas, assim como fez a jornalista e escritora Heloísa Noronha.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Com seu lixo, fazemos arte

Rodrigo Machado e Pado (Urban Trash Art)



Reportagem publicada na edição nº 25, do jornal-laboratório "Olhar Social", do curso de Jornalismo da Universidade Municipal de São Caetano do Sul - USCS



Por Nilton Carvalho

Enquanto o trem não chegava o copo de café espantou a preguiça provocada por um sábado nublado e frio. Apesar de estar com o mapa nas mãos, ao desembarcar na estação da Lapa, precisei da ajuda de quatro pessoas para conseguir, enfim, chegar ao meu destino. Entrevistar artistas é uma tarefa desafiadora, principalmente, quando eles desenvolvem um trabalho diferente do convencional. Esta minha meta, escrever sobre a dupla Urban Trash Art, também conhecida pela sigla UTA, que há um ano e oito meses elabora esculturas a partir de materiais coletados no lixo e é formada por Rodrigo Machado, 37, e Cleber Padovani, 29, também conhecido como Pado.


Quando cheguei ao meu destino, percebi que a caixa de correio havia sido criada a partir de um pneu. O conceito “intervenção” de fato estava no ar. O ateliê ficava ao lado esquerdo da entrada principal da casa, mas antes do bate-papo, fui convidado para almoçar. O conceito de elaborar montagens faz parte da rotina de Rodrigo até nos momentos em que ele vira cozinheiro, dois tipos diferentes de macarrão dividiam a mesma panela.


Após a refeição, a conversa começou. Rodrigo e Pado me contaram que a dupla se conheceu após alguns projetos na área de cenografia. “Começamos a trabalhar juntos e percebemos muitas coisas que a gente tinha em comum, entre elas, coletar resíduos na rua e levar para casa”, conta Rodrigo. Entretanto, quando notaram que havia certa afinidade entre os dois, ainda levou um tempo para o projeto sair do papel. “A gente sempre falava “vamos qualquer dia, vamos qualquer dia”, e como todo final de semana tinha evento, nunca dava”, lembra Pado. Certo dia, a decisão de iniciar o trabalho foi tomada, nascia o Urban Trash Art. “Era um domingo. Saíamos aos domingos porque era o único dia livre que a gente tinha”, diz Rodrigo.


Todo artista de rua possui boas histórias e com o Urban Trash Art não é diferente, ao longo da conversa, fiquei sabendo das vezes em que a dupla se deparou com figuras bem conhecidas do contexto urbano como mendigos e garis. “Com garis temos várias histórias, até ajudamos eles a limpar em algumas ocasiões”, lembra Rodrigo. Certa vez, a dupla desmontou duas esculturas para aproveitar o material na elaboração de outra obra, quando surgiram dois moradores de rua. No momento em que Rodrigo e Pado estavam de saída, um dos mendigos virou e perguntou: “o que eu faço se alguém quiser comprar isso aí?”, foi então que Rodrigo respondeu: “pode vender, acho que você consegue pegar uns dez mil dólares”. No entanto, o destino daquela obra foi bem diferente do que eu podia imaginar. “Quando passei por lá, alguns dias depois, notei que ele havia desmontado metade da obra. Com metade ele fez uma fogueira e com a outra parte fez um barraco. Ele estava morando dentro da escultura”, diz Rodrigo.


Com tantas histórias e experiências relacionadas à arte, pensei que tanto Pado quanto Rodrigo tinham formação em artes, mas para minha surpresa, a trajetória deles é bem diferente. “Me formei na FAAP, em Licenciatura e Educação Artística e já pintava telas”, conta Rodrigo. Já Pado foi acumulando conhecimento instintivo, algo que nasce com o artista. “Eu não sei como explicar muito bem, sou artista plástico autodidata, não fiz faculdade, não fiz nada. Fui me virando e aprendendo as coisas na raça”, lembra. Acreditar que arte se aprende somente na faculdade é limitar a habilidade que certas pessoas desenvolvem, pelo simples fato de terem nascido com esse dom. “Tanto eu que fiz faculdade como ele que não fez, somos iguais, estamos juntos”, completou.

Toda obra necessita de um nome para ganhar vida, nesse aspecto, as esculturas elaboradas pela dupla chamam a atenção. “Certa vez, fizemos um trabalho no SESC Araraquara e tínhamos pensado em diversas coisas, mas na hora tudo mudou e decidimos fazer um caracol. Durante a montagem, o caracol começou a parecer um jacaré e então batizamos a escultura de jacaracol”, conta. Quando a entrevista caminhava para o seu desfecho, Rodrigo colocou um pedaço de madeira debaixo do meu gravador, alegando que a captação do som ficaria melhor, puro instinto de intervenção.


O ano de 2010 foi muito bom para a dupla, eventos importantes como a Virada Cultural e o mega festival SWU foram bastante comemorados pela dupla. “O SWU será a maior vitrine que a gente já teve e o nosso vigésimo trabalho”, destaca Rodrigo. O pouco tempo de estrada trouxe bons frutos e Pado não esconde a satisfação de um trabalho bem feito. “Por mais que sejamos malucos, nós chegamos e fizemos a coisa acontecer”, diz.


Definir o trabalho do Urban Trash Art é passear por uma série de possibilidades que vão desde sustentabilidade até uma espécie de trabalho politizado. “O mundo precisa de pessoas que pensem nessa questão do lixo”, diz Rodrigo. Já o engajamento, serve para mostrar ao público outra visão, no que diz respeito ao lixo urbano. “Antes de você jogar fora isso, com esse objeto é possível fazer outra coisa”, conta Pado.


Pelo que parece, a dupla Urban Trash Art está bem afinada. Seja na amizade ou nas experiências artísticas, Rodrigo e Pado certamente terão um caminho de sucesso pela frente. A proposta de elevar materiais encontrados no lixo à categoria de arte, como Marcel Duchamp fez com o urinol, representa uma maneira bastante conceitual de fazer arte. O entrosamento da dupla não é percebido somente nas intervenções artísticas, mas também nas brincadeiras, como o pedido que Pado me fez no final da entrevista. “Não esqueça de colocar na matéria que o Rodrigo me mata de vergonha”.

sábado, 9 de abril de 2011

A revolução de Ródtchenko






A exposição Aleksandr Ródtchenko: revolução na fotografia, pode ser visitada até 1 de maio, na Pinacoteca do Estado de São Paulo. O fotógrafo, pintor, escultor e designer gráfico participou de um dos períodos mais importantes da arte russa, ao lado de nomes como Kasimir Maliévitch e Wassily Kandinsky.


No vídeo acima, é possível visualizar alguns trabalhos de Ródtchenko na área de design gráfico.

quarta-feira, 23 de março de 2011

O grande romance do Sr. Tolstói

O escritor russo, Leon Tolstói


Por Nilton Carvalho


“Comecei devagar e derrotei o Sr. Turguêniev. Treinei e derrotei o Sr. de Maupassant. Lutei dois rounds difíceis com o Sr. Stendhal e fui ligeiramente melhor que ele. Mas ninguém nunca vai me pôr num ringue com o Sr. Tolstói, a não ser que eu enlouqueça”, disse certa vez o escritor Ernest Hemingway.

Por incrível que pareça, eu tive uma sensação parecida quando terminei de ler o romance Guerra e Paz, do escritor Leon Tolstói, na última sexta-feira. Não que eu queira me comparar aos escritores citados por Hemingway, isso nunca, mas porque eu realmente fiquei muito impressionado com a riqueza dos personagens da obra do escritor russo.

O romance, que narra as guerras napoleônicas e ao mesmo tempo traça a história de três famílias aristocráticas da Rússia, é uma aula de humanismo e também de história. Para concluir o livro, o escritor fez uma pesquisa minuciosa e o resultado é uma narrativa surpreendente.

Dentre os principais trechos, eu gostaria de destacar a descrição que o escritor fez de Napoleão, no momento em que o francês está à frente de seu exército, apenas observando o movimento das tropas russas e também a análise sobre liberdade e poder, nas páginas finais do romance. Obviamente que depois de conhecer Guerra e Paz vou querer ler mais obras do autor.

Para quem não conhece “o grande romance da paz”, o recado que deixo é que essa leitura é obrigatória para os amantes da literatura universal, pois trata-se de um recorte histórico, preciso e coeso, que mescla realidade e ficção em meio a um acontecimento marcante na história da humanidade.

terça-feira, 22 de março de 2011

Confissões de um "quase-jornalista" em conflito

Nilton Carvalho, jornalista que escreve neste blog


Por Nilton Carvalho


A decisão de estudar jornalismo na faculdade veio da minha inquietação em relação ao mundo. Curioso, cético e sem identificação com o empreendedorismo da área administrativa, fui obrigado pelo destino a entrar para o time de Garcia Marquez e companhia. Bom, pelo que sei o jornalista e escritor colombiano não cursou faculdade, mas isso não vem ao caso.

Durante o primeiro ano, as disciplinas teóricas foram me afastando cada vez mais do meu emprego. Era insuportável fazer boas leituras, como Baudelaire, Theodor Adorno e Marilena Chauí e no dia seguinte atuar no departamento administrativo de uma multinacional.

O negócio foi ficando ainda mais complicado no segundo ano, quando as aulas ganharam praticidade, o que me deixava com muita vontade de ser jornalista, ou quem sabe até um profissional renomado.

Hoje, atuando na área, observo o universo de possibilidades e de caminhos que o jornalismo pode tomar. Agora, é possível perceber a responsabilidade que a profissão possui. Nas eleições deste ano pude notar o quanto é difícil buscar a isenção, pois imparcialidade não existe, como diria o velho jargão. Alguns casos de colegas que perderam o emprego por defenderem a verdade de determinados fatos que iam de encontro com a opinião do jornal me deixaram confuso sobre a nossa real função.

Outros preferem expor a violência em estado bruto, apoiados no sensacionalismo do jornalismo policial. Como se mostrar cenas mórbidas fosse capaz de “informar” melhor o telespectador. Bobagem. O jornalismo de hoje se sente no direito de direcionar os assuntos de relevância pública e sequer ouvem ou procuram conhecer a população para saber suas reais necessidades. Muitas vezes, nos esquecemos que somos prestadores de serviço e que temos uma missão social fundamentada na Constituição.

Dentre as diretrizes que venho aprendendo na universidade, muitas passam despercebidas dos jornalistas donos do saber, que ocupam seus tronos nas grandes redações. No entanto, espero poder contribuir para manter a credibilidade do ofício, que tanto fez pelo país em tempos difíceis de ditadura militar até a redemocratização.

Erros e acertos fazem parte da rotina de qualquer profissional, mas a sensação que fica é que o jornalismo deve seguir novos rumos em tempos digitais. Hoje, as redes sociais nos permitem conhecer melhor as pessoas, mas essas ferramentas ainda são pouco exploradas. No meu caso, em especial, sei que ainda tenho muito que aprender antes de finalizar o curso de jornalismo. Na verdade, terminar a faculdade não significa saber tudo porque a vida é um eterno aprendizado.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Um videorrepórter no MediaOn 2010

Susan Grant (CNN), Jaime Spitcovsky (mediador) e Aron Pilhofer (New York Times) na Super Session de abertura do evento (foto:Ricardo Matsukawa/Terra)


Por Nilton Carvalho




O texto a seguir narra minha primeira experiência como videorrepórter.




Era possível avistar o trem chegando quando eu olhei para o relógio e percebi que estava bastante atrasado. Ir da estação São Caetano até o metrô Brigadeiro, em meia hora, seria tarefa das mais difíceis. Mas, contei com a sorte, pois o entrevistado, Aron Pilhofer, editor de notícias interativas do New York Times, atrasou meia hora, superando meus dez minutos.

Minha primeira experiência como vídeorrepórter, que ocorreu justamente no 4º Seminário Internacional de Mídia Online (MediaOn), me deixou um pouco nervoso. Eu tinha uma entrevista importante e jamais havia controlado a câmera e o microfone ao mesmo tempo. Outra dificuldade seria o idioma, apesar de conhecer bem o inglês, meu vocabulário talvez não fosse tão rico para uma entrevista deste porte e não havia nenhum tradutor.

Quando Pilhofer chegou, eu já tinha decorado o que iria dizer e consegui estabelecer um diálogo satisfatório. No entanto, como eu não tinha experiência em filmar, confesso que no começo da entrevista a câmera tremia muito e a grande dificuldade foi encontrar um ponto que me proporcionasse estabilidade. Fiz as perguntas de maneira bem lenta para que o entrevistado pudesse entender e a conversa fluiu.

A entrevista foi bastante focada em web jornalismo, busquei informações que fossem relevantes para os nossos desafios aqui na Tv ABCD. Fazer um jornalismo interativo, que valorize a participação do público e também que conte histórias de maneira criativa e inovadora. Tópicos que, aliás, Pilhofer abordou durante painel no qual participou. Foi então que percebi que a tal “Aldeia Global”, idealizada pelo teórico Marshall McLuhan, está cada vez mais intensa com o poder da internet e novas tecnologias.

No final, com o braço um pouco dolorido de segurar a câmera em uma posição fixa, me despedi do entrevistado e de sua assessora de imprensa. Aron Pilhofer foi bastante cordial e quando ficou sabendo que eu ainda estava cursando jornalismo, resolveu inverter os papéis. “Como tem sido esta experiência?”, perguntou o editor. Olhei para o entrevistado e sua assessora e disse, “estar perto das pessoas, conhecer suas histórias e tentar transmiti-las em uma linguagem nova, tem sido um desafio e uma experiência única”.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

A queda do "Belas Artes"

Cine Belas Artes, durante os anos 90


Por Nilton Carvalho


A cidade de São Paulo possui diversos pontos turísticos, lugares onde é possível entrar em contato com a história, através de lembranças que despertam sentimentos. O Cine Belas Artes é, sem dúvida, um desses espaços, mas infelizmente está prestes a dar o último suspiro.

O proprietário André Sturm recebeu uma notificação em dezembro, alegando que o imóvel deveria ser desocupado até fevereiro. O dono do imóvel, Flávio Maluf, deseja abrir uma loja no local e decidiu acabar com um dos cinemas mais tradicionais de São Paulo.

O Belas Artes atravessava uma crise financeira, após ter perdido o patrocínio do banco HSBC. Desde então, Sturm passou a correr contra o tempo para não perder o espaço. O patrocínio veio em novembro, mas como no mundo capitalista ‘tempo é dinheiro”, o proprietário Flávio Maluf já havia traçado o triste destino do cinema.

A postura artística e apaixonada pela sétima arte sempre foi a marca registrada do Belas Artes. Na década de setenta, foram exibidos clássicos de Fellini e Antonioni em suas salas. Hoje, o cinema é conhecido por deixar os filmes, de grande bilheteria, durante um longo período em cartaz, fazendo com que o filme conquiste ainda mais o público. Um exemplo de paixão pelo cinema.

É difícil imaginar a esquina da Paulista com a Consolação sem o Belas Artes. Apesar dos protestos, que devem ocorrer ao longo do mês de janeiro, o cinema vai mesmo abandonar o local. Nem mesmo o valor cultural e artístico parece ser páreo para o poder exercido pelo dinheiro na sociedade.

As inúmeras histórias vividas pelos cinéfilos apaixonados, que um dia passaram pelo Cine Belas Artes, ficaram sem passado e temem pelo futuro incerto. Mesmo que o proprietário André Sturm encontre logo um novo espaço, o antigo endereço do cinema será para sempre um cartão postal apagado.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Janelle Monáe, um andróide que dança como James Brown

Janelle Monáe


Por Nilton Carvalho


No universo musical, dizem que de tempos em tempos os estilos se renovam, ou seja, artistas criativos aparecem trazendo propostas inovadoras. Esse é o caso da cantora norte-americana, Janelle Monáe, de 25 anos, que se apresenta no Brasil este mês.

A cantora surgiu com o disco Metropolis: Suite I (The Chase), de 2008, que começou a aguçar o ouvido da crítica especializada. Entretanto, foi com o ótimo The ArchAndroid (Suites II and III), de 2010, que a moça abalou de vez as estruturas da música soul.

Criativa, Janelle Monáe criou uma espécie de andróide, que dança como James Brown e que mescla referências como David Bowie, Nina Sinome e Michael Jackson. O personagem interpretado pela cantora traz um visual futurista e ao mesmo tempo retrô, ingredientes que arremataram elogios no mundo da música. Dentre eles, o topo da lista de melhores discos de 2010, de acordo com o jornal britânico The Guardian.

É com toda essa moral que a nova sensação da música negra chega ao país, mesmo que os holofotes estejam todos voltados para Amy Winehouse, que se apresenta após Monáe no festival Summer Soul. Mais uma vez a criatividade mostrou força na música e colocou o disco The ArchAndroid (Suites II and III) na discografia básica da sou music.